20/09/2022

Diversidade e inclusão são temas profundos e extensos ao mesmo tempo. É possível encará-los como poça d’água ou como oceano.

Mas por que “ou”? Dá caminhar pela poça sem perder de vista as oportunidades de mergulho e de grandes aprendizados. Assim como já falamos aqui sobre racismo e homofobia, sempre deixando claras a importância e a necessidade urgente do combate ao preconceito e aos estereótipos, chegou a vez de tocar em outro assunto essencial da vida: a deficiência física, visível ou não.

Entre as crianças, essa conversa pode começar antes da convivência de fato. Se a familiaridade com o tema já existe, a literatura infantil vem para enriquecer e aprofundar essa relação.

Pessoas com deficiência em casa ou no círculo familiar extenso facilitam o diálogo, a intimidade e a experiência com uma nova maneira de estar no mundo. Se essa presença próxima não existe, cedo ou tarde vai aparecer na escola, em um elevador, na rua, no parque etc.

Criança é curiosa e faz perguntas simples, diretas. Quem está com ela também pode se preparar para responder e ajudá-la a refletir sobre as infinitas maneiras de viver, e de poder viver bem, mesmo que algumas dificuldades pareçam intransponíveis para quem não as sente.

Selecionei livros sobre deficiências variadas, que evidentemente não esgotam sua diversidade. Teremos a oportunidade de voltar ao assunto no futuro e apenas uma certeza: não faltarão livros para chacoalhar nossas convicções!


As cores do mundo de Lúcia – Jorge Fernando dos Santos e Denise Nascimento (Editora Paulus, 2010) –
Este é um livro sobre todos os sentidos. Os cinco sentidos básicos que conhecemos bem (visão, audição, tato, paladar e olfato), o sexto, que vamos descobrindo ao longo da vida, e o sétimo, que é encontrar o sentido da vida mesmo quando nos falta um sentido entre os básicos.

A garotinha Lúcia não pode enxergar, mas conhece as cores pelo cheiro, pelo tato e pelo som.

As delicadas ilustrações de Denise Nascimento, em que apenas uma personagem aparece de olhos abertos, e o texto de Jorge Fernando dos Santos mostram que há inúmeras maneiras de se perceber o mundo.


A princesa do olhinho preguiçoso – Ricardo Ishmael e Heitor Neto (Editora Mojubá, 2020) –
Essa história começou com a sobrinha do autor, que foi diagnosticada com ambliopia — quando um dos olhos enxerga menos do que o outro. Por causa disso, a personagem passa a usar um tampão e óculos de grau e é vítima de bullying na escola.

A situação é versátil o suficiente para que crianças com qualquer deficiência visual se identifiquem ou mesmo as que sejam alvos de discriminação, humilhação, chacota, exclusão, ameaças e/ou agressões (verbais ou físicas) sem relação com deficiência física. O livro tem tradução para o inglês e para o espanhol.

Amarílis – Eva Furnari e Cárcamo (Editora Moderna, 2013) – Nas palavras da própria autora, Amarílis, o único livro que ela não ilustrou, é uma história de amor. Luiza e Tiago, seu irmão que não enxerga, inventam um jogo. Ele escolhe um livro qualquer na estante e abre em uma página aleatória. Ela precisa ler para ele e, se encontrar uma imagem, deve descrevê-la sem o uso de recursos visuais.

Ela desenvolve a capacidade de atribuir características de tato e de outros sentidos a coisas que se vêem. Inspirada pelo irmão, torna-se escritora. Ele, graças a ela, pode ver o mundo de uma maneira muito especial. Amarílis é o nome de uma flor que Luiza apresenta ao Tiago.

O livro foi finalista do Prêmio Jabuti em 2014, entrou para o catálogo de Bolonha em 2013 e na lista de Altamente Recomendável da FNLIJ em 2014.

Tom – André Neves (Editora Projeto, 2012) – Tom é a narração das inquietações e o questionamento de um menino cujo irmão — Tom – tem algum grau de autismo. Nesse livro ilustrado, as imagens de André Neves se sobrepõem e se misturam, usando técnicas de transparência, para entregar ao leitor um sentido que as palavras nem sempre são capazes de traduzir, especialmente quando se trata de tentar decifrar o mundo interno de alguém.

O livro tem tradução na Espanha, na Dinamarca, nos Emirados Árabes e na Suécia. Recebeu Prêmio Jabuti e FNLIJ de Melhor Ilustração em 2013, além do selo FNLIJ de Altamente Recomendável. Fez parte da lista dos 30 Melhores Livros Infantis da Revista Crescer em 2012.

Menino Baleia – Lulu Lima e Natalia Gregorini (Mil-Caraminholas, 2021) – Este livro traz a história do garotinho Roger, sem dizer em momento algum que ele é autista. As ilustrações refletem características físicas e comportamentais de crianças do espectro, mas também típicas de qualquer outra criança. A relação dele com as outras crianças do livro reforça o objetivo de compreensão e de inclusão.

E a poesia está por toda parte da linda metáfora com a baleia, por meio de sua imensidão e profundidade, assim como por meio do espaço em que habita. A obra proporciona um oceano de leituras, cheios de boas ondas para conversas ricas e desafiadoras com os pequenos.

As aventuras de um cão chamado Petit – Heloísa Prieto e Maria Eugênia (FTD, 2021) – Petit é adotado pela família de Olivia quando nasce sua irmã Alice, como uma vacina anti-ciúme. Alice, conforme vai crescendo, prefere ficar no seu mundo e com Petit. Balança o corpo para a frente e para trás e, às vezes, troca os amigos pela… parede.

A família percebe que ela é diferente das outras crianças e se une para ajudá-la a superar suas dificuldades, sempre com o grande Petit ao lado. A narrativa é permeada por questões de identidade, relacionamento, diferenças, inclusão e respeito. Ilustrações delicadas contribuem para transmitir o afeto familiar encontrado em todas as páginas dessa obra.

Re|set, 18/09
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